Entre o real e o possível, entre o
desejo e a escolha, entre a flor e a dinamite.
Boa noite! Apesar do título desse discurso remeter mais à
Filosofia e à Psicanálise do que à História, não poderia deixar de fazer uma
breve revisão nono ano. Calma....essa revisão não é para o ENEM, nem para o PSS. No 9º
ano estudamos muito sobre o século XX, com seus horrores, seus campos de
concentração, suas bombas atômicas, suas ditaduras, suas revoluções, seus
processos de independência, a queda do muro, o mundo globalizado, a
redemocratização. Um novo mundo se abria, novas tecnologias, foguetes, IA,
robôs (que nunca nos substituirão Isa...rsrsrs), novos futuros, novas
possibilidades, prateleiras, consumo, novas marcas, novas escolhas. E uma nova (ou velha) polarização nasceu (ou
renasceu), já se fala em desglobalização, uma Guerra Fria 2.0 se descortina,
disputas territoriais voltam a nos atormentar, Gaia (se ainda não sabem quem é,
nono ano, vão descobrir. Se a curiosidade for maior que a espera, dá um google
aí), Gaia extenuada com a ingratidão de seus filhos, especialmente nós, os
bípedes inteligentes. Somos fruto de nossas escolhas, individuais e coletivas. E
aqui dialogamos com Sartre. Cada um de nós está refém das escolhas que faz
todos os dias. E lembrem-se: “não escolher” é também uma escolha. Somos um ser
aberto para o amanhã, para o possível, para o desejo. Sartre afirmava que não
importa o que fizeram de nós, mas o que faremos daquilo que fizeram de nós.
Muitas vitórias foram conquistadas até aqui caros estudantes, bem como muitas
frustrações, muito riso e muito choro. Vocês encerram hoje um ciclo meus caros ,
e iniciam outro. Muitas escolhas serão feitas, muitas possibilidades se abrirão
para todos vocês e para todos nós. E escolhas são feitas todos os dias. Como
dizia Aristóteles, um ato justo não torna um homem justo, são precisos muitos
atos justos, constância, equilíbrio, até a virtude. Por isso, erramos mais do
que acertamos, assim, somos o único que ser que pode sentir a angústia, a
ansiedade, a depressão, mas também a esperança, a fé, o riso, a graça e a
vitória. Para isso temos a arte, a dança, o cinema, o teatro, um bom livro, uma
boa conversa, a sensação boa de resolver uma equação de segundo grau
desafiadora, uma oração profunda, uma viagem prazerosa, um amigo sincero, um
delicioso chocolate, um café quentinho com pão de queijo, um abraço e um beijo
gostoso de quem amamos e de quem nos ama, uma formatura, num ciclo que, sabemos,
nunca termina. Somos o mesmo e somos um outro todos os dias.
Dessa maneira, como dizia Nietzsche, é preciso olhar as coisas por
muitos prismas, muitas perspectivas, não para chegar à verdade absoluta (ela
talvez seja mesmo uma grande fábula, uma quimera, uma metáfora), mas para
sermos mais profundos e mais sinceros, menos vaidosos e mais leais a nós mesmos.
Então, também Sartre precisa ser contestado, como o século XX precisa novamente
ser contestado, porque não olhou seriamente para o seu abismo, não foi capaz de
enxergar o monstro que criou e que passou a habitar seus porões, as dinamites
que ainda carrega nas mãos, as flores que foram escondidas. O mundo precisa de
uma pausa e de um olhar para o passado, porque ele importa sim, criou traumas,
fissuras e feridas que ainda estão abertas e voltaram a nos atormentar. Também
nós, e cada um de nós, somos uma linha tênue entre o que fizeram de nós, o que
está ao nosso alcance e o que nos constituiu como somos agora. Nossa eterna
criança (como dizia Freud) carrega nas mãos dinamites e flores, amores e
desilusões, abandonos e completudes, luz e escuridão, desejos e interditos. Que
saibamos olhar para a criança e ensiná-la a não puxar o pino que pode espalhar
dor, sofrimento e destruição ao redor. Mas que também ensinemos nossa criança a
não puxar o pino quando estiver sozinha, que saiba olhar para suas dores
contemplando as flores nos momentos difíceis, e, sempre que a vida nos der a
oportunidade, que ela saiba espalhar suas flores e tornar a plantá-las, todos
os dias. Seremos os mesmos todos os dias, a criança trará a flor e a dinamite.
Busquemos juntos ser melhores, assim, esse espaço será melhor, nossas
aprendizagens serão muito melhores e, quiçá, o mundo também o será, assim como
Gaia talvez tenha tempo de nos perdoar e mande embora Kronos. Também ela merece
reflorescer e espalhar sua beleza e encanto. Kronos precisa de tempo. Nós
precisamos de tempo. Que os dias que virão nos permitam acolher o que somos e
nos dê coragem para transformar o que podemos. Que a mudança possível comece
comigo e com você!
Muitíssimo obrigado! Cuidemos de nossa criança e a ajudemos a fazer boas escolhas e espalhar flores, muitas flores. Cuidemos uns dos outros. Cuidemos de Gaia.