terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Discurso de formatura 3ºA - SESI Itapeva 2020



 Hoje é dia de gratidão!

Gratidão imensa a cada ser humano aqui presente, a cada animalzinho de estimação que ofereceu companhia e carinho para tantas pessoas nesse 2020, a cada animal, planta e rio que resistiu e resiste a todas as tentativas de aniquilação. Gratidão a todos os heróis invisíveis desse país, especialmente os profissionais da saúde.

Gratidão imensa ao 3º ano por terem me escolhido paraninfo para representar toda a equipe de professores e professoras de nossa escola, de todos os ciclos pelos quais passaram, de todas os espaços escolares que já frequentaram. Esse momento é a consolidação de um longo percurso, de uma rede enorme de pessoas que passaram pela vida escolar de cada um e cada uma: merendeiras e merendeiros, jardineiros e jardineiras, seguranças e recepcionistas, agentes de limpeza, funcionários e funcionárias da administração e manutenção, agentes de apoio escolar, analistas, estagiários e estagiárias, bibliotecários e bibliotecárias, coordenadores e coordenadoras pedagógicas, diretores e diretoras, professores e professores, colegas de sala e familiares. Pensem em quantas pessoas foram importantes para esse momento de concretizar? Evidente que nós, do SESI, somos os prediletos, não é mesmo? Quem aqui está desde pequeno ou pequena, não tem outra escolha.

Gratidão imensa por estarmos vivos, com saúde e o coração repleto de alegria para celebrarmos o dia de hoje. O dia de hoje precisa e merece ser celebrado, mesmo com todas as angústias que ainda nos aperta o coração e a alma.  

Gratidão imensa por todos os desafios que esse ano nos colocou no caminho. E eles começaram quando vocês ainda tentavam nos convencer a comprar a camiseta da sala. Lembram? “Gente, que camiseta é essa? Num tem condição não gente! Caro demais! Sé doido!”. “E tem o blusão se quiser professor”, gritou alguém. Quê? Vai meu pagamento inteiro nesse trem doida!”. Risos, risos, passos apressados para convencer a mim e aos demais colegas. E tudo que parecia tão grande, tão imprescindível, ficou pequeno, vazio, sem sentido. Mas como disse a vocês na última aula: a festa foi adiada, não cancelada. E ela será muito maior, mais plena e vibrante. Lembrem-se do que dizia Epicuro. Há sofrimentos e dores que, se suportados com sabedoria, podem nos proporcionar prazeres e felicidades muito maiores do que a própria dor sentida. A privação pode nos ensinar a valorizar o que antes nos era despercebido: os olhares, os gestos, o afago, o riso, a lágrima, o tom da voz, o cheiro do corpo, o toque, o sussurro, o grunhido, a tes, a amizade, essa o bem mais duradouro e fértil segundo esses mesmos filósofos. Oxalá tudo isso nos torne maiores e mais humanos, como vocês alunos e alunas do 3º ano se tornaram ao longo de todos esses anos. Foi no 7º ano, projeto de Empreendedorismo, que os conheci pela primeira vez. Eu sequer fazia ideia do tamanho da encrenca que me aguardava. Meus tímpanos ainda vibram com tantos entusiasmos, discussões, reclamações, e quantas reclamações! Competição acirrada, quase impossível formar uma equipe sem alguém chegar pertinho e falar baixinho: “Não coloca essas duas pessoas no mesmo grupo professor, vai dá morte!”. Lembram? E chegou a Feira de livros (o SESI tem essa coisa de produto final a muito tempo, não é Fer, Isa e Vanessa?). No final, fizemos uma feira maravilhosa, arrecadamos centenas de livros, uma tenda colorida e vibrante. Ali eu entendi o potencial de vocês, especialmente das alunas e alunos que ficaram. Muitos foram embora e a turma encolheu. Rostos demarcavam o medo, uma sensação estranha de vazio e ao mesmo tempo alegria pelos que ali fincaram pé. “Não vou embora, meu lugar é aqui” era a mensagem. Mas e agora? Meu Deus? Essa turma não se forma no médio meu pai! Lembram amigos e amigas? De repente, vem um, mais uma na outra semana, mais duas na seguinte. Felicidade contida. Estávamos esperançosos, mas tínhamos que fazer o centrão dialogar com a extrema-direita e extrema-esquerda. Sim, escola é lugar de política. Lembram da “arquitetura” da sala? Na psicanálise isso tem nome: mecanismos de defesa. Pasmem, eles nos protegem, mas também nos ocultam. E é preciso tempo, paciência, cuidado e afeto para que os muros sejam colocados abaixo. Não é no embate, na marra, na marreta. É na escuta, na observação atenta, na aproximação vagarosa, silenciosa. “Então agora somos uma coisa só professor? Não há mais nenhuma barreira?” Vocês sabem a resposta. Mas sabem também que as mais importantes foram ao chão: a vaidade, o orgulho e a indiferença. Nasceu o cuidado, o respeito e a partilha. Vocês já estavam se preparando para o que enfrentariam nesse 2020 sem sequer imaginar. Vocês foram enormes, gigantes. Confesso que não sei se teria forças para ser tão resiliente se, na idade de vocês, tivesse que passar por tudo o que passaram. Nietzsche nunca fez tanto sentido pra mim como ao olhar para vocês nesse momento. Ele chamava tudo isso de autossuperação, de quem é capaz de fazer das pedras fortaleza, das dores o vigor do espírito. “O que não me destrói, me fortalece!”. Viver a vida como obra de arte, mesmo em meio ao caos e o ocaso. No caso de sua filosofia, falava num tom bastante solitário. Vocês demonstraram que é possível construir grandes obras de arte a muitas mãos. Muitíssimo grato por terem nos ensinado que é possível, principalmente hoje, quando vemos tantos exemplos que querem nos convencer do contrário, de que o que vale é o egoísmo mais mesquinho, a ignorância mais abjeta, o ódio mais mortal.

É um ano tão desafiador, que até um discurso de formatura, que antes parecia fluir tão naturalmente, repleto de poesia e divagações filosóficas, hoje deu lugar ao pulsar do coração, a uma alegria que não sei de onde vem diante de tanta dor. Quiçá as Moiras nos quisessem fazer desistir e abandonar tudo, para que Cloto finalmente pudesse cortar o fio. Mas não vamos, assim como vocês formandos e formandas não desistiram. Desejamos o melhor para cada um e cada uma! Que o amor, o cuidado e a sabedoria que nos ensinaram nos ajude a vencer o ódio, o egoísmo e a ignorância.

E lembrem-se do que eu disse: se um dia, já mais velhinhos e velhinhas, alguém puxar assunto de formatura, deixem falar. Apenas no final da conversa: me formei em 2020. O resto você entenderá! Vocês são e serão a história viva!

Que a vida sorria para vocês, como fizeram para nós, mesmo que remotamente e com a câmera desligada. Valeu mesmo!

Um beijo no coração e gratidão imensa!

Prof. Júlio Garcia

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